"Lula é cafona..."
Quem se não lembra de quando o não-cafona cantor, acima ilustrado em momento de descontração, proferiu: “Marina é Lula e é Obama ao mesmo tempo. Ela é meio preta, é cabocla…É inteligente como o Obama, não é analfabeta como o Lula, que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro. Ela fala bem”.
Hoje, lendo uma postagem de um blog, lembrei-me do ocorrido, e resolvi reproduzir essa bizarrice proferida pelo chique e calorento ídolo da MPB, com a devida resposta de um linguista.
Já respondi, aqui, à Rede Globo e Moniquinha , em postagem de 2011 (clique aqui para ler "É uma mula esses jornalista") sobre linguística... Para o PIG, creiam-me, o intuito de derrubar Ministro petista e atacar Lula justifica, até mesmo, tentar derrubar, à força, os paradigmas de uma ciência!
Já respondi, aqui, à Rede Globo e Moniquinha , em postagem de 2011 (clique aqui para ler "É uma mula esses jornalista") sobre linguística... Para o PIG, creiam-me, o intuito de derrubar Ministro petista e atacar Lula justifica, até mesmo, tentar derrubar, à força, os paradigmas de uma ciência!
CAETANAS BOBAGENS
Marcos Bagno – Outubro de 2008
Caetano Veloso é um dos mais brilhantes letristas, compositores e cantores da nossa música popular. Mas ele não se satisfaz com isso. Também quer ser sociólogo, antropólogo, filósofo, historiador, ensaísta, cineasta, teólogo, crítico literário… Recentemente, decidiu falar de lingüística. Com a petulância dos mal-informados e a arrogância das celebridades, acredita que por ter lido Saussure em meados do século passado está autorizado a dissertar sobre e, principalmente, contra os lingüistas profissionais. Vá estudar, Caetano: a ciência da linguagem já passou por muitas revoluções epistemológicas desde 1916. Ou não se meta a falar do que não sabe, dizendo que sabe.
Não tenho como debater todas as bobagens que ele escreveu e que as caetanetes se apressaram, gotejantes, em elogiar. Me restrinjo à defesa que ele faz dos falsos gramáticos que invadiram a mídia brasileira na última década e meia. O problema que os lingüistas apontam no trabalho dessas pessoas é que elas apregoam um estereótipo tosco, rígido, estreito e, finalmente, mentiroso de “língua certa” que não corresponde aos usos reais e efetivos nem sequer das nossas elites urbanas mais letradas. Formas lingüísticas usadas há mais de um século e consagradas na obra dos nossos melhores escritores são sistematicamente combatidas por esses gramaticóides como “erros”, “desvios” e “impropriedades”. Opções que aparecem na própria escrita poética de Caetano são veementemente condenadas por eles. Ou não? “Deixa eu cantar pro meu corpo ficar Odara”, por exemplo…
Os lingüistas não são populistas nem demagogos. Essa é a acusação tacanha de quem só lê pela metade o que nós escrevemos, se é que lê. Defender as variedades lingüísticas das camadas desprestigiadas não significa dizer que esses cidadãos não devem ter acesso a um grau mais elevado de letramento (não sabe o que é letramento? vá estudar!). Todos os lingüistas que conheço (e conheço muitos) lutam pelo pleno acesso dos cidadãos às formas prestigiadas de falar e de escrever. Acontece que essas formas prestigiadas reais não são o modelo estúpido e jurássico de “português correto” que os falsos gramáticos tentam inculcar em suas manifestações na mídia. Há um abismo profundo entre a verdadeira norma culta brasileira, falada e escrita pelas nossas camadas privilegiadas, e a “norma oculta” que os gramaticóides defendem. É contra isso que os lingüistas se batem.
Os brasileiros urbanos letrados falam e escrevem uma língua que não é reconhecida como legítima, porque no nosso imaginário lingüístico vigora um ideal de correção inspirado em usos literários lusitanos de meados do século XIX. Se você não fala como Eça de Queirós escreveu, está tudo errado! Até quando, meu pai Oxóssi?
Infelizmente, quando o assunto é língua, até mesmo as pessoas mais inteligentes se deixam engambelar por aquilo que os estudiosos de língua inglesa chamam de “folk linguistics”, um conjunto de mitos, superstições e inverdades sobre a língua e a linguagem que se entranharam na cultura ocidental e que resistem a toda contestação racional, baseada na pesquisa científica e nos dados da realidade.
Surrupiado do blog de Fábio Campana:
http://www.fabiocampana.com.br/
por Mastrandea