quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Feitiço contra feiticeiros no STF



Às vésperas da retomada do julgamento da Ação Penal 470, quando o STF irá examinar os recursos dos 25 condenados, o ambiente no tribunal é descrito da seguinte forma por Felipe Recondo e Debora Bergamasco, repórteres do Estado de S. Paulo, com transito entre os ministros: 

“(...) há ministros que se mostram “arrependidos de seus votos” por admitirem que algumas falhas apontadas pelos advogados de defesa fazem sentido. O problema (...) é que esses mesmos ministros não veem nenhuma brecha para um recuo neste momento.
Pois é, meus amigos. 
Após quatro meses de espetáculo pela TV, a notícia é que alguns ministros do STF estão com medo. Não sabem como “encontrar um meio termo entre rever parte de seu voto sem correr o risco de sofrer desgaste com a opinião pública.”
É preocupante e escandaloso. 
Não faltam motivos muito razoáveis para um exame atento de recursos. Sabe-se hoje que provas que poderiam ajudar os réus não foram exibidas ao plenário em tempo certo. Alguns acusados foram condenados pela nova lei de combate a corrupção, que sequer estava em vigor quando os fatos ocorreram – o que é um despropósito jurídico. Em nome de uma jurisprudência lançada à última hora num tribunal brasileiro, considerou-se que era razoável “flexibilizar as provas” para confirmar condenações, atropelando o direito a ampla defesa, indispensável em Direito. Centenas de supressões realizadas pelos ministros no momento em que colocavam seus votos no papel, longe das câmaras de TV, mostra que há diferença entre o que se disse e o que se escreveu. 
O próprio Joaquim Barbosa suprimiu silenciosamente uma denuncia de propina que formulou de viva voz, informação errada que ajudou a reforçar a condenação de um dos réus, sendo acolhida e reapresentada por outros ministros. 
Eu pergunto se é justo, razoável – e mesmo decente – sufocar esse debate. Claro que não é. 
É perigoso e antidemocrático, embora seja possível encher a boca e dizer que tudo o que os réus pretendem é ganhar tempo, fazer chicana. Numa palavra, garantir a própria impunidade. 

Na verdade estamos assistindo o processo em que o feitiço se volta contra o feiticeiro. E aí é preciso perguntar pelo papel daquelas instituições responsáveis pela comunicação entre os poderes públicos e a sociedade – os jornais, revistas, a TV. 
O tratamento parcial dos meios de comunicação, que jamais se deram ao trabalho de fazer um exame isento de provas e argumentos da acusação e da defesa, ajudou a criar um clima de agressividade e intolerância contra toda dissidência e toda pergunta inconveniente. 
Os réus foram criminalizados previamente, como parte de uma campanha geral para criminalizar o regime democrático depois que nos últimos anos ele passou a ser utilizado pelos mais pobres, pelos eternamente excluídos, pelos que pareciam danados pela Terra, para conseguir alguns benefícios -- modestos mas reais -- que sempre foram negados e eram vistos como utopia e sonho infantil. 
(A prova que se queria criminalizar o sistema, e não corrigir seus defeitos, foi confirmada pelo esforço recente para sufocar todo esforço de reforma política, vamos combinar). 
No mundo inteiro, os tribunais de exceção consistem, justamente, num espetáculo onde a mobilização é usada para condicionar a decisão dos ministros. 
Morte aos cães!, berravam os promotores dos processos de Moscou, empregados por Stalin para eliminar adversários e dissidentes. 
Em 1792, no Terror da Revolução Francesa, os acusados eram condenados sumariamente e guilhotinados em seguida, abrindo uma etapa histórica conhecida como Termidor, que levou à redução de direitos democráticos e restauração da monarquia. 

No Brasil de 2013, a pergunta é se os ministros vão render-se ao medo.

Por Paulo Moreira Leite

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